sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA



            Na Cidade em que moro, a prefeita foi afastada do cargo pela justiça 12 vezes por conduta vedada pela lei no período das eleições, o ambiente social divide opiniões que quase sempre são inflamadas por paixões antagônicas em que cada um a sua maneira, defende seus próprios interesses, ninguém pensa na coletividade propriamente dita. Passeando pela estante de livros que tenho, vi Triste Fim de Policarpo Quaresma, que li na adolescência e resolvi rever agora para tirar algumas observações sobre o impasse do mundo político e social.



            Lima Barreto não conheceu notoriedade em vida. Foi preciso que o tempo lhe fizesse justiça. Triste Fim de Policarpo Quaresma sua obra mais famosa, se consolidou como um clássico, porque nasceu de um lance de gênero e traduziu os impasses do Brasil do seu tempo. No romance, o major Policarpo Quaresma, vive de idealismos nacionalistas. A primeira parte o retrata como um nacionalista que vive em seu gabinete cercado de livros, alimentando uma imagem distorcida do país; a segunda parte, como um proprietário de terras que percebe que as saúvas são arrasadoras para a plantação. A terceira, como voluntário na Revolta da Armada, que é preso após criticar o Marechal Floriano Peixoto, a quem idealizava.



            Quando Quaresma se dá conta da própria postura quixotesca está prestes a ser executado pelo exército. Quaresma queria basicamente três reformas: da cultura, da agricultura e da política, quanto a isso, ele continua mais atual do que nunca. Seu sonho mais singular foi de oficializar o tupi-guarani como idioma brasileiro. Certas desventuras e encantos do protagonista, poderiam ser vistas como do próprio autor, mas seu brilhantismo nesse romance passa ao longe da autobiografia.





            Lima Barreto carregou preconceitos ao longo da vida, filho de mestiços ficou órfão de mãe aos 7 anos e mais trade viu o pai enlouquecer; tendo de amparar a família, não conseguiu terminar o curso na Escola Politécnica. Enfrentou depressão e alcoolismo e foi internado duas vezes no Hospício Nacional. Ele foi sobretudo, um intelectual combativo que, também marginalizado no meio literário, expressava as contradições de uma sociedade que ainda vivia a transição da Monarquia para a República. O que mais gosto da leitura desse livro é sua ironia sarcástica do momento histórico que retrata.



            Triste Fim de Policarpo Quaresma se insere no Pré-Modernismo brasileiro pela forma e temas que desenvolve. A rejeição de Barreto ao eruditismo e ao rebuscamento estilístico se explica como uma postura de oposição a chamada elite literária; com isso, seu coloquialismo antecipava características modernistas. Livro indiscutível para repensar os interesses coletivos de uma sociedade.  

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

CALLADO: O PAI DO CHORINHO NACIONAL



            Quando escuto chorinho, não tem como não ser reportada a uma ideia de uma música genuinamente nacional, apesar de muitos considerar como música de natureza mais folclórica, é inegável sua leveza, alegria e musicalidade transbordante. Foi com o chorinho que o Brasil descobriu o seu som. O flautista e compositor carioca Joaquim Callado (1848-80), foi uma figura fundamental nesse cenário musical. Considerado o pai do choro e autor de mais de 600 canções.


            Em 1876, Machado de Assis fez um elogio rasgado a Callado em sua coluna quinzenal na revista Ilustração Brasileira. Machado diz não levara a sério muitos deles, mas a respeito de Callado diz: foram convidar um lacedemônio a ouvir um homem que imitava com a boca o canto do rouxinol. Eu já ouvi o rouxinol respondeu ele. A mim quando me falarem de um homem que tocava flauta com as próprias mãos eu respondi: eu já ouvi o Callado.


            Além de tocar divinamente Callado compunha músicas com uma batida diferente, sincopada, que daria origem ao choro. É bom lembrar no entanto, que na época de Callado o choro era mais uma maneira de tocar do que propriamente um estilo musical. Ainda não havia uma música popular brasileira consolidada. Ouvia-se o lundu de origem africana e estilos como a polca e a mazurca, músicas de salão europeias. A polca parece ter sido a mais contagiante, porque oferecia a oportunidade de pela primeira vez dançar juntinho. A formalidade da valsa e outras danças de salão começava a ficar para trás.


            Essa nova música que nascia sob a flauta de Callado, viria a se tornar a coroa do Brasil. Callado e sua música eram discriminados pelos grandes salões, porque ouvir o erudito era considerado chique. Ele foi criativo, acima de tudo e teve a coragem de arriscar num ambiente impregnado de referências europeias. A partir daí a síncopa passou a ser característica da música popular brasileira, era a hora e a vez do novo som, e da formação da identidade musical brasileira, com notável contribuição de Joaquim Callado.
            

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

TEATRO DE REVISTA NO BRASIL



            Dos vídeos do You tube estão entre os meus favoritos aqueles que trazem filmes com números do chamado Teatro de Revista, com artistas como Zé Trindade, Virgínia Lane, Renata Fronzzi, Emilinha Borba dentre outros. Os filmes são dos anos 1950, e estão enquadrados no gênero das chamadas chanchadas, filmes carnavalescos comuns nesse período produzidos pela Atlântica a mais famosa produtora carioca da época, com enredos simples, populares que em sua maioria parodiavam sucessos do cinema americano com o popular Teatro de Revista.


            O Teatro de Revista buscava a interação com o público era uma revisão de costumes em que se ironizava e se sondava a alma brasileira. No enredo via-se sempre alguém perdido, perseguido. Os personagens parecem caricaturas, alegorias, com atores que tenham um caráter de improvisação, espontânea, como Oscarito e Grande Otelo, Dercy Gonçalves e Zé Trindade. À este ator cabia, dançar, cantar, possuir o tempo da comédia e a agilidade do improviso.



            Mas a grande atração eram as atrizes que cantavam, dançavam e rebolavam dentro de seus maiôs, com uma sensualidade provocativa numa sociedade que ainda se via pudica, mas que a olhos contemporâneos, chega a parecer inocente. Chamadas de vedetes, receberam influencia francesa, o que pode ser visto com as plumas, o sotaque francês e a bossa como um todo, isso deslumbrou o povo, esse teatro foi se transformando até adquirir características nacionais peculiares que culminam no que pode se definir como uma identidade genuinamente brasileira do gênero.

Para ser vedete, era preciso ser bonita e escultural, e representava na Revista, o último número do espetáculo, era a apoteose. Em 1950, Virginia Lane recebeu do Presidente Vargas o título A Vedete do Brasil, era tão fantástica que nem ele resistiu aos seus apelos, mantendo com ele um discreto caso amoroso por 15 anos. Fez 37 filmes durante sua carreira, hoje sua indefectível apresentação de Sassaricando chega a ser cult. Outras famosas da época foram: Renata Fronzzi, Elvira Pagã e nos anos 1940 Luz del Fogo, primeira naturista brasileira.

A vida particular das vedetes era o que causava interesse e aumentava o seu sucesso, Elvira Pagã, no início da década de 1950 na praia de Copacabana foi a criadora do biquíni, exalava sexualidade e enlouquecia a constante plateia feminina. Era manchete permanente de escândalos, a bomba que escandalizava a preconceituosa sociedade da época. Chegou a ser impedida de entrar no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, frequentado pela alta sociedade da época.

Gosto de ver os vídeos porque considero que é a melhor forma artística que representou a ideia que o Brasil tinha de si, onde é possível reconhecer a sociedade brasileira nos palcos e traçar uma identidade cultural do país. O interessante é que não se abdicava em suas apresentações do olhar crítico e irônico dos acontecimentos sociais da época. Eram produções recheadas de humor e duplo sentido, apesar de ser um gênero marginalizado, considerado menor, enriqueceram a produção nacional e dialogaram muito bem com o mundo de então. 

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

UM SONHO DE LIBERDADE



            Um Sonho de Liberdade mais do que um filme é uma experiência espiritual, que cria uma expressão tão calorosa em nossos sentimentos que é capaz de nos fazer sentir membros de uma família. O filme flui lentamente seguindo o ritmo calmo e observador de seu narrador. É mais profundo do que a maioria dos filmes e traz como mensagem fundamental a continuidade de uma existência baseada em esperança e amizade.


            A cena de início do filme mostra o condenado, o banqueiro Andy, recebendo prisão perpétua pela morte da esposa e do amante. E o personagem de Morgan Friedman narrando a primeira vez que o viu. Desde a chegada de Andy no ônibus da prisão até o final do filme nos só vemos como os outros o veem. A história é construída de forma diferente nos fazendo questionar se Andy, realmente matou aquelas pessoas? Ou porque ele é tão introspecto. Não é uma história centrada num herói bravo e destemido, que seria o convencional.


            Boa parte do filme envolve muda solidão e reflexão filosófica sobre a existência. O personagem de Morgan Friedman é o condutor espiritual do filme nos o vemos em três audiências de condicional,  depois de vinte, trinta e quarenta anos. Na primeira ele tenta convencer a junta que está reabilitado, na segunda ele finge e na terceira ele rejeita, qualquer forma de liberdade e o interessante é que ao fazer isso ele deixa seu espírito livre.


            O filme foi construído para nos fazer observar a história e não para distrair a plateia. Acho que distração é o que tem de muito pouco nesse filme. Os atores gostam de desempenhar os seus papéis. A história se desenrola de forma ordenada, e o filme reflete a longa passagem das décadas. O personagem de Morgan Friedman reflete e diz: quando eles colocam você na cela, quando aquelas barras de ferro batem violentamente cerrando as portas, então você sabe que é verdade. A velha vida desaparece, nada resta a você além de todo o tempo do mundo para pensar a vida.


            Revendo o filme, eu o admirei mais do que a primeira vez. O apreço por bons filmes, cresce com a familiaridade, assim como acontece com a música. Alguns costumam dizer que a vida é uma prisão, essa prisão pode ser por motivo de escolhas ou por se está doente, sendo assim, somos Red, o personagem de Friedman e o nosso redentor é Andy. O filme é uma obra de arte que trata de uma coisa mais profunda do que ele seja capaz de admitir.