segunda-feira, 16 de junho de 2014

A ÉTICA SOCRÁTICA NOS TEMPOS ATUAIS


            Ética significa sem rodeios ou grandes dificuldades “estudo dos hábitos e de suas normas”. Na vida real, a palavra ética surge quando nada mais se tem a dizer, e seu significado é quase nulo. Em meio ao impasse da crença culturalista de que o mal em si não existe porque tudo é construção social, portanto objeto de manipulação retórica e midiática, vivemos a pulverização dos critérios de valor. O conflito entre relativismo e universalismo ético sempre rasgou a reflexão filosófica desde o emblemático embate socrático-sofista.



            Os sofistas definiam a verdade como o efeito da retórica de um indivíduo sobre outro e afirmavam ser o ser humano “a medida de todas as coisas”. O filósofo via nisso uma raiz da barbárie: a elevação da retórica ao nível de norma de construção social de valor que implicaria no niilismo vulgar da sabedoria interesseira. Temos ai uma séria dúvida quanto a viabilidade moral da democracia para além de um sistema que se afoga na retórica.




            Sócrates defendeu a busca de ideias universais e racionais (o bem, a justiça, a sabedoria...), mesmo que essa busca se definisse antes de tudo, pela consciência crescente de uma certa ignorância. Devo ser capaz de reconhecer que quanto mais sei, mas sou capaz de perceber quanto ainda preciso saber. A orientação ética é clara: superar a desordem de um sistema baseado no somatório de opiniões superficiais e na racionalidade interesseira. Em tempos atuais Sócrates continua mais necessário do que nunca. 

sábado, 14 de junho de 2014

OS AUTO RETRATOS ESSENCIAIS PARA A HISTÓRIA DA ARTE


            O auto- retrato é uma confissão de intimidade. Um misto de ideias e imagens em que o pintor tenta responder com ênfase duas questões: “o que sou ?” e “o que é a pintura ?”. Selecionei quatro óleos sobre telas que marcaram a arte ocidental.


            Durer, Albrecht (Auto Retrato com Flor de Cardo, 1493)- foi feito quando o pintor alemão tinha apenas 22 anos. Na obra, notam-se marcas do aprendizado de Durer em ourivesaria e gravura. As mãos nervosas do artista seguram um ramo de cardo, a pintura tenta esconder uma certa timidez. A tessitura das roupas é tratado com o cuidado de uma pintura flamenga. O cabelo revolto parece ser encimado por uma flor de alcachofra.


            Rubens, Peter Paul (Auto Retrato com sua mulher Isabel Brandt, 1609)- Isabel está paramentada como uma rainha. Aqui o estilo flamengo é rigoroso, bordados e brocados são exaltados. Os tecidos (veludo, lã, seda entre outros) são facilmente identificados, assim como o brilho dos metais. O ideal de prosperidade e felicidade burguesa, calcado na aristocracia, reveste toda a pintura.


            Velásquez, Diego (As Meninas, 1656)- auto retrato emblemático da pintura ocidental, com o objeto que mais representa ideias abstratas. O pintor veste o hábito de cavaleiro de Santiago, a cruz no peito, comenda que só ganharia no fim da vida. Pinta os reis, que mal são vistos em reflexo, e, saindo de trás da tela, parecem anunciar: isto é pintura de reis, mas quem a vê é mais importante.



            Cézane, Paul (Auto Retrato, sem data)- é, entre os pintores consagrados, o pior retratista do século 19; quem sabe até da pintura ocidental. Quando pintava sua mulher pedia que ela ficasse imóvel como uma maça. As pessoas para ele eram meros elementos de figuração. Não tinham mais importância que os objetos ao seu redor. Ainda assim, em seu auto retrato, Cézane conseguiu reter o espaço humano, como até então ninguém havia realizado.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

COLHEITA O SAMBA BOM DE MARIENE DE CASTRO


            Conheci a baiana Mariene de Castro no disco Ser de Luz em que ela interpreta músicas da sambista Clara Nunes. Recentemente comprei seu mais novo disco Colheita lançado em fevereiro de 2014. O disco expõe seu sincretismo musical com forte brasilidade e musicalidade nacional tocante. Suas músicas são elegantes, e ela já figura na lista das grandes cantoras brasileiras, ela tem a força que vem de raiz como diz o título do samba antigo Roque Ferreira.



            O samba do disco é interpretado com fé e expressa a melhor tradução do povo brasileiro. O reportório reúne 14 canções impecáveis, amparadas por um time de músicos de primeira. São sambas que vão dos filosóficos aos divertidos com letras que trazem temas como fé, amor, respeito, trabalho, esperança, luz, alegria, coragem e paz.




            Mariene tem profunda influência de Clara Nunes, mas não a imita. Sua voz tem fluência admirável, sem esforço, ela vai do grave aos tons altos, com uma segurança de quem sabe o talento que possui. Colheita é um disco refinado, mas que precisa emplacar e ser conhecido e ouvido pelo grande público. Mariene é uma grande cantora e hoje colhe frutos do seu talento.

terça-feira, 10 de junho de 2014

O ROMANTISMO DO FILME O ATALANTE


            Para viver para sempre feliz com quem você ama, é preciso ter a capacidade de conviver com o outro e suportar tudo. Pequenos problemas devem ser ultrapassados. Ela não gosta de gatos sobre a mesa quando está comendo. Ele guarda roupa suja no armário a mais de um ano. Ela guarda para si os momentos que passam juntos. Ele curte o seu melhor amigo, barbudo e tagarela. Ela quer ver Paris. Ele se preocupa com o seu trabalho.



            O Atalante, de 1934, do francês Jean Vigo, nos conta uma história de amor desse tipo e consta nas listas entre os grandes filmes da história do cinema. Em linhas gerais, parece uma história comum. Começa com o casamento de Jean, um jovem capitão de uma barcaça, com Juliete uma jovem de um vilarejo. Não há festa no casamento, ela vai morar diretamente na barcaça com o marido, Jules um marinheiro que andou no mundo, um taifeiro e pelo menos meia dúzia de gatos.



            Certa noite ela escuta no rádio as mágicas palavras isto é Paris. O marido preocupado com o trabalho não a leva para ver a cidade, ela decide sair sem que ele perceba e quando volta a barcaça não está mais lá. O bonito do filme é que a história não é banal, mas apresentado de uma forma poética. Mais do que ligar o jovem casal a qualquer enredo eles são os momentos que a memória irá iluminar daqui a cinquenta anos, basta ver a primeira manhã deles, quando acorda ouvem uma serenata de acordeão e uma canção de marinheiro.




            O filme apresenta um ar suavemente poético. Na fotografia a maioria dos planos captura o frio das paisagens dos canais, os esfumaçados bistrôs, os apertados quarteirões e magnificência da velha barcaça. É o tipo de filme que você irá voltar a apreciar como sua canção preferida. Lembrando-se de onde estava quando a ouviu pela primeira vez e como fez você se sentir. Dentre as alternâncias entre tristeza e felicidade, esse casal nos ensina que o amor sobrevive, se realmente for amor. 

domingo, 8 de junho de 2014

O MELHOR DA ARTE BRASILEIRA


            Analisando acervos sobre as artes plásticas nacionais elaborei uma lista de obras consideradas referência para a história da arte brasileira. Do academicismo de Almeida Júnior, passando pelo modernismo e concretismo, até chegar a produção contemporânea nacional. A lista não tem a pretensão de esgotar o debate, inúmeras outras obras podem ser acrescentadas, o que pretendo é jogar luz dentro de uma perspectiva temporal as artes brasileiras.


Almeida Júnior (1850-1899)- o pintor estudou na Academia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro entre 1869 e 1874. Em 1876 recebeu uma bolsa de estudos do Imperador D. Pedro II e estudou na Franca até 1882. As telas que representa cenas e personagens da província paulistana em sua vida interiorana são considerados a parte mais importante de sua produção, caso do célebre óleo sobre tela O Violeiro (1899).


Lasar Segall (1891-1957)- Lituano de nascimento, Segall veio para o Brasil em 1923, já como um legítimo representante das vanguardas europeias. O artista dizia que o Brasil tinha lhe revelado o milagre da cor e da luz, distanciando seu trabalho da sobriedade e dos tons cinzentos e terrosos. Bananal (1927), em tons de verde reverberam de forma mais ritmada pela tela é característica dessa nova fase.


José Pancetti (1902-1958)- o ex marinheiro carioca começa sua obra na década de 1920, de forma completamente intuitiva e autodidata, nos momentos de folga ou de solidão em alto mar. No início dos anos 50 muda-se do Rio para Salvador e as cores dos seus quadros passam a sofrer influência da luminosidade do litoral baiano, caso emblemático deste conhecido óleo Musa de paz (1950).


Waldemar Cordeiro (1925-1973)- nasceu em Roma, onde estudou na academia de Belas Artes. Em 1948, se muda para São Paulo. Convexo (1954) é um importante exemplar de desenvolvimento da arte concreta tal como concebida por Cordeiro: fatura impessoal e a criação de uma realidade visual a partir de elementos gráficos simples.


Nelson Leirner (1932)- suas obras colocam em cheque o sistema de arte. Em 1967, enviou para o quarto salão de Arte Contemporânea do Distrito Federal um porco de verdade (empalhado), obra que foi aceita pelo júri. Hoje O Porco (1967), já está incorporado ao sistema que questionou sendo importante obra das artes nacionais.



Edgard de Souza (1962)- um dos mais importantes artistas de sua geração, surgiu nos anos 80, trabalhando com pintura, desenho e gravura, mas passando, na década de 1990, à produção de objetos e esculturas que tomam a medida do corpo como experiência para o fazer, em trabalhos artesanalmente construídos, e de forte caráter erótico, como a série gotas.